Après moi, le déluge

Por Juan Pablo Filho, 01/11/21

A forma. Eis o único modo de euforia. Não é possível uma verdadeira catarse em qualquer modo no qual se apresente sem antes a forma, pois a imaginação é escrava da realidade e não o seu oposto. Explico. 

Não há nada no intelecto que antes não tenha passado pelos sentidos. Mesmo o subconsciente, esta tara psicanalítica que serve para explicar todos os fenômenos inimagináveis, depende daquilo que de algum modo foi sentido, visto, cheirado, tocado ou degustado. Não é possível a invenção de algo do zero; apenas a sua imitação falha pelo que fora apreendido, algo que é aquém da forma que ela se apresenta na realidade, pois é interpretada pela subjetividade intrínseca humana.

Na arte tenta-se emular a realidade, ou a falta dela, através de meios que a natureza nos disponibiliza. É impossível fazer arte sem matéria prévia. Se apenas houver a mente não é possível que algo seja reproduzido, pois a mente só pode reconhecer a sua própria existência através daquilo que está na realidade. Uma pessoa sem sentidos, se é que isto existe, não pode saber da sua própria existência ou aprender algo, nem menos sentir a euforia.

Ou seja, tudo aquilo cuja forma for distorcida a modo de que seja impossível ao intelecto e à emoção não pode ser compreendido ou sentido. Quando se deteriora a forma, como foi feita no modernismo mais radical, não se pode alcançar o almejo principal dos próprios modernistas: a destruição da realidade através da euforia. A euforia só pode ser sentida quando há forma real.

A destruição da realidade, cujo labor foi empreendido de modo falho pelos modernistas, no entanto, teve um grande rival cuja obra fez-se de frente com ela. Um homem que pode gabar-se de tê-la destruída. Este é Richard Wagner.

Richard Wagner, com a sua sutil distorção do modo romântico de fazer música, foi o homem responsável pelo fim do mundo. Se não houvessem os tambores e êxtases do neopaganismo grandiloquente de Wagner, um homem que se fez contra o próprio Deus, não haveria pós-modernidade.

Ora, foram as intensas melodias de Wagner que levantaram o fracassado modernismo; foi o seu amor pelo estado-nação como um suserano virtual que fez com que ideologias nazifascistas pudessem ter o seu ser; e ele foi a intensidade que fez Nietzsche negar o próprio ser e abrir alas para todos que negaram a própria realidade depois. A era do iluminismo, breve como a queda da Bastilha, acaba em Wagner.

E como Wagner destruiu a realidade? Não foi no caos absoluto. Wagner seduziu a sua audiência para um êxtase absoluto não distorcendo a forma, mas transmutando-a em algo outrora inimaginável; o novo Big-Bang, uma realidade nova.

Depois disso, o mundo acabou. Isto apenas não foi avisado.

 

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