Foxtrot, 1972. Genesis. Dia a Dia#1

 Dia a Dia #1

    Foxtrot, 1972. Genesis.


By Pedro Marcos Queiroz, 31/07


    Primeiramente insiro que essa classe de matérias é bastante particular de minha vida e meu cotidiano, o que se explicita no título, por assim dizer. Não creio que textos do tipo sejam recorrentes como os outros, muito menos edificantes como os outros, não é esse o meu objetivo para o que eu penso em escrever agora. Prometo que não me demoro.
    
    Penso que seja de um conhecimento geral dos leitores que me acompanham, da minha situação de saúde psicológica(algo que pelo mesmo motivo não é necessariamente explicitada aqui) e da batalha tremenda que foram os meses passados e apesar de que ocorra de maneira terrivelmente mais branda nos dias de hoje, ainda ocorre, da mesma forma.
    O dia-dia de alguém que é portador de qualquer que seja a patologia mental, é inevitavelmente mais complexo e mais intrincado que da grande parte do cotidiano das pessoas ditas "sãs". São atitudes, meios terapêuticos, modos de vida completamente distintos. Tudo isso aplicadamente para que a vida se torne de certa forma mais cabível e aproveitável. No caso de isso ser seguido e de uma dose de fé e sorte, diria eu, qualidade de vida e sentido existencial são elementos que podem ser reformulados e renascidos(muitas vezes das cinzas) de maneira que é demorada, progressiva e dolorosa, mas que ocorre, quase que inevitavelmente. 
    Falo por uma perspectiva tanto embasada quanto própria. Foi o que ocorreu comigo. Foram longos 3 anos de luta, dos quais estive imerso em uma profunda depressão que dava a impressão horrenda de que eu nunca sairia daquele poço pútrido, frio e ausente de luz. Pois bem que saí sim, por mais que o poço seja uma metáfora infame e que nunca se sai totalmente dele. Após a subida até a superfície o poço começa a fazer parte de você, do seu eu interior e nos resta aprender a lidar e adaptar para com ele.
    Apesar de toda minha cabeça positiva, de certo senso de visionarismo, do bom humor, em alguns momentos o poço fala mais alto e em alguns momentos não há forças suficientes para calá-lo. Estive em uma situação semelhante a essa há pouco tempo. Pouquíssimo. Devido a uma sequela que carrego comigo, tive dificuldade em exercer tarefas que sempre foram triviais para mim. Que sempre me conduziram e me mantiveram com os pés no chão. A leitura e a escrita. 
     Digo que mesmo com toda a evolução que tive ainda tenho dificuldades em lidar e me adaptar a certas diferenças que tenho hoje comparadas a um ano atrás. Esse momento de dificuldade me deslocou de meu eu-comum e caí rapidamente em um estado de angústia e tristeza imenso.

    Com isso vocês podem me perguntar: "O que isso tem a ver com música?". Respondo que a música para mim talvez hoje seja a maior demonstração que eu devo continuar lutando.

    Num dia em que custa levantar da cama, sempre me existe um álbum que levanta junto comigo, me ajuda a levantar.
    Sempre que deliro, um vocalista canta mais alto.
    Sempre que eu sinto tão pouco um violão me faz sentir tudo.
  Sempre que estou enfurecido por me sentir tão sozinho, uma guitarra distorcida me acompanha.

    Hoje eu senti, não delirei e por extensão estava muito bem acordado. Contudo estava terrrivelmente triste. Resolvi reescutar um disco qualquer de minha biblioteca e o "Foxtrot" do Genesis foi o escolhido. Ou eu que fui o escolhido do disco.
    Antes mesmo dos vocais de Peter Gabriel se iniciarem, senti algo que pouco consigo transpor em palavras. Mas o pouco que posso se trata disso: "Pedro, a gente sabe que tá difícil. Vamos tentar te ajudar e pode chorar se quiser". Foi isso que fiz e acho que nunca senti tanto a força de expressão de uma composição como senti com essa.
    Fui preenchido totalmente pelo som. A música não vinha de fora, vinha de dentro. Do local mais profundo, aquele que eu sequer sei que existe. Repleto, fluía por mim como se fosse meu sangue e ao invés de somente chorar, eu me senti abraçado, amado pelo disco, enquanto normalmente acontece o processo inverso. De uma regressão à infância tremenda, dos medos mais primitivos que acometem uma criança e um responsável a embala, a tranquiliza e a ama como a criaturinha mais importante da face da Terra. Hoje, eu crescido, homem formado, me sentindo indefeso quanto a minha própria incompletude, me vejo embalado por um disco que foi composto a 49 anos atrás, de uma cultura distinta, de pessoas que nunca saberão meu nome, apesar de serem meus ídolos. Um disco antigo, mas nunca velho.

    Aquilo que novamente tenho que comentar, em momento algum é evitável sofrer, evitável ir contra a nossa própria natureza falha. É de buscar ABRIGO em um lugar seguro e depois que a tempestade for embora, voltar a nos dedicarmos em nossa própria sina. 

    Não consigo inserir outra sensação além de "amor" para a situação que passei agora. Música é amor, arte é amor.

    A música me acompanha todos os dias, foi uma das coisasa que salvaram minha vida(e salvam todos os dias de uma maneira diferente).

    Por fim, eu espero do fundo do meu coração, que quem quer que esteja lendo esse relato, já tenha seu abrigo(s) consolidado. E caso contrário, que nunca deixe de buscar. Esses abrigos salvam existências.

    Por ter a presunção de que essa matéria não vai muito longe, eu agradeço a atenção, a companhia de cada um dos que me acompanham e vibram por mim. Amo todos vocês.





                                                                                                                            Com todo o amor do Mundo,


ass: Pedrinho.





















Comentários

  1. Parabéns, querido! Você é um exemplo de enfrentamento daquilo que a natureza humana mais teme: sua própria mente…
    Muito provavelmente a experiência de sentir que o trivial tornou-se inacessível por algum motivo, lhe fez sentir-se também confrontado a não enxergar apenas “o poço”, mas e, principalmente, a corda que poderia tirá-lo de seu solo úmido, solitário e inóspito… Sim! É possível sair dele… com muita perseverança e busca incessante pelo (re)nascimento da esperança de dias melhores… claros… ensolarados… onde existe vida e cor, apesar da existência da dor…
    Bem, você saiu do “poço” e agora, a vida lhe espera de braços abertos; lhe disponibilizando as muitas linhas das inúmeras páginas de todas as histórias, contos e narrativas que desejar ler e/ou escrever. Espero compartilhar muitos deles!
    Orgulhosa de você!

    De sua tia que lhe ama e admira muuuuito.

    Dra. Cynthia Nara Dorini

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  2. minha nossa. estou absolutamente sem palavras. pedro, "o poço começa a fazer parte de você, do seu eu interior e nos resta aprender a lidar e adaptar para com ele" e "em momento algum é evitável sofrer, evitável ir contra a nossa própria natureza falha", que escrita linda, é sempre maravilhoso ver em palavras a reprodução da mente de alguém tão incrível. que bom que encontrastes teu abrigo na música e eu não poderia estar mais orgulhosa de quem és e da luta e garra que tens dentro de você. absolutamente fenomenal, te amo <3

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